Por Thiago Romero Agência FAPESP – Em todo o mundo, discussões sobre a importância do avanço do conhecimento científico tendem a ser marcadas com muita freqüência pelo discurso de caráter utilitário. É quando partem da sociedade perguntas como “para que serve determinada descoberta?”
O questionamento é válido, uma vez que, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, quando a ciência passou a ser um empreendimento fortemente estatal, os agentes envolvidos com as pesquisas científicas precisaram se preparar melhor para explicar aos contribuintes os benefícios sociais de seus estudos – principalmente aqueles desenvolvidos com financiamento público.
O assunto foi discutido na noite desta terça-feira (8/4), em São Paulo, durante debate paralelo à exposição Revolução Genômica, cuja programação cultural é organizada pela revista Pesquisa FAPESP.
Na ocasião, Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, e Roberto Freire, presidente do Partido Popular Socialista (PPS) e ex-senador da República, foram desafiados a responder o questionamento do título da mesa-redonda: “O avanço da ciência torna a humanidade melhor? Por quê?”.
Na opinião de Brito Cruz, como muitos setores da sociedade moderna são afetados diretamente pelos resultados das pesquisas científicas, é fundamental que os cidadãos comuns tenham um conhecimento geral, ainda que de maneira superficial, de alguns temas estratégicos que são investigados nas universidades e nos institutos de pesquisa.
“Nem todo mundo precisa entender a fundo como funciona o DNA, por exemplo, mas é importante ter noções sobre o assunto, se não a sociedade pode ficar sujeita a crendices que a induzem a se sentir enganada ou a desconfiar dos cientistas”, disse.
“Enquanto a ciência aprende novas coisas e ajuda o ser humano a se tornar dono do seu destino, cabe à sociedade se organizar para aplicar ou não esse conhecimento em benefício da população”, afirmou.
Por outro lado, segundo Brito Cruz, estar a todo momento em busca de benefícios práticos para a ciência pode ser um equívoco, considerando que há certas descobertas que não resultam em aplicação imediata. Muitos resultados de estudos serviriam mais para tornar a humanidade melhor do que para qualquer outro tipo de aplicação prática que pudesse resultar, por exemplo, na fabricação ou na inserção de um novo produto no mercado.
“Com sua curiosidade inata, o ser humano sempre procurou conhecer mais. Quando os cientistas pesquisam os corpos celestes, por exemplo, há uma preocupação em entender como funciona o Universo. Eles não estão necessariamente em busca de um benefício material a curto prazo”, disse.
Para Roberto Freire, se os seres humanos têm hoje a oportunidade de conseguir uma qualidade de vida cada vez mais satisfatória, em parte isso se deve ao conhecimento científico acumulado desde os primórdios da civilização em áreas como as que conseguiram decifrar detalhes sobre a evolução natural. “Os cientistas partem do desconhecido e se dedicam às suas pesquisas para inovar e salvar vidas”, assinalou.
“Por isso, há um grande respeito à ciência na sociedade e entre os políticos e, com exceção de temas polêmicos como o da liberação das células-tronco embrionárias, que envolve questões sociais e religiosas, tradicionalmente não há grandes impedimentos para discutir os usos e benefícios dos avanços científicos no meio político”, afirmou Freire.
Conhecimento pré-científico
Para o diretor científico da FAPESP, o exercício da ciência, na maioria dos casos, tende à criação de melhores condições de vida para a população. “Se formos acompanhar o progresso da humanidade, ao analisarmos as crenças seguidas pelo homem por meio de religiões e de histórias mitológicas, o assunto do conhecimento sempre esteve presente de forma relevante”, apontou.
Ele ilustrou a afirmação com uma passagem bíblica, presente no livro do Gênesis: tentada a pegar o fruto da árvore do conhecimento, Eva foi expulsa do Paraíso. “Mesmo preocupado com os perigos e as conseqüências do conhecimento, o ser humano sempre foi atraído pelo conhecimento por conta dos benefícios que ele pode trazer”, afirmou.
Para Brito Cruz, também foi determinante para o avanço do conhecimento humano o desenvolvimento de um sistema de aplicação do método científico para atacar os problemas à medida em que eles aparecem.
“No século 18 houve uma notável mudança nas pesquisas devido ao uso do método da ciência, o que permitiu aos pesquisadores aprender com os erros e testar novas alternativas até conseguir resultados mais confiáveis”, disse.
Seguindo essa linha de raciocínio ele destacou que a ciência, quando passou a ser feita de maneira mais organizada, em especial a partir do século 16, permitiu, entre outros avanços, um aumento na expectativa de vida da população.
“O que o ser humano mais deseja em sua existência é viver mais. Se na época em que não existiam medicamentos como antiinflamatórios ou penicilina as pessoas viviam, em média, 40 anos, agora estamos caminhando para uma expectativa de vida perto dos 90 anos. E cientistas da área de saúde já estão dizendo que, se conseguirmos vencer o desafio da hipertensão, poderemos viver até 120 anos. Nesse caso, o desafio científico passará a ser o do sistema previdenciário”, apontou Brito Cruz.
Para ver as próximas palestras e debates da programação cultural da Revolução Genômica, clique aqui.
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