sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Interações sociais podem alterar expressão dos genes, mostram estudos

Da Agência Fapesp

O DNA determina em boa medida quem são os indivíduos e como eles lidam com os outros. Mas, de acordo com uma pesquisa realizada por cientistas da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, nos Estados Unidos, estudos recentes sobre animais sociais - como aves e abelhas - estão dando força à idéia de que, por meio do cérebro, os genes e o comportamento social são uma via de mão dupla, influenciando-se mutuamente.

A pesquisa de revisão, coordenada por Gene Robinson, do Departamento de Entomologia da Universidade de Illinois, foi publicada em matéria de capa da edição desta sexta-feira (7/11) da revista "Science". De acordo com Robinson, o estado atual das pesquisas permite que os cientistas partam para a construção de uma explicação molecular para o comportamento social.

De acordo com os cientistas, a informação social é capaz de alterar a expressão genética no cérebro, influenciando o comportamento. Por exemplo, o canto do tentilhão ou zebra-finch (Taeniopygia guttata) macho induz em outros machos a expressão do gene egr1em uma região específica do cérebro dedicada à audição. Essa expressão genética está especificamente ligada à importância social do sinal - isto é, indica se o som vem de um indivíduo conhecido ou de um potencial intruso -, indicando que a resposta genética ajuda o pássaro a reconhecer e reagir a mudanças no ambiente social.

Por outro lado, a variação genética influencia a função cerebral e o comportamento social, como acontece no caso da drosófila, ou mosca-da-fruta (Drosophila melanogaster). Cientistas identificaram uma variação genética específica que afeta o ritmo do som de acasalamento do animal, que conseqüentemente influencia o comportamento reprodutivo.

Segundo os cientistas, graças aos recentes seqüenciamentos de genomas de vários animais sociais - incluindo as abelhas e os tentilhões - e às novas tecnologias como os microarrays, que permitem vislumbrar a atividade de milhares de genes de uma só vez, os neurocientistas gradualmente estão compreendendo que "existe uma relação dinâmica entre genes e comportamento", disse Robinson. "O comportamento não está gravado no DNA", afirmou ele.

Além de Robinson, participaram do estudo o professor de biologia da Universidade de Stanford Russell Fernald e o professor de desenvolvimento celular e biológico e neurociências David Clayton, também da Universidade de Illinois.

Segundo Robinson, uma pesquisa coordenada por Clayton em 1992 foi um dos marcos fundamentais para os estudos nessa área. Naquele trabalho, a equipe do cientista descobriu que a expressão do gene egr1 aumenta no cérebro de tentilhões e canários quando eles ouvem um canto novo emitido por um macho da mesma espécie.

O achado não foi inédito: estudos anteriores haviam demonstrado que os genes acendem e apagam quando um animal é treinado para desempenhar uma tarefa em laboratório, segundo Robinson. Mas, quando a equipe de Clayton encontrou essa alteração na expressão gênica em resposta a um sinal social, chamou a atenção para as interações sociais poderosas que podem alterar a expressão genética no cérebro.

Em outro trabalho, Robinson utilizou microarrays para estudar o fenômeno em larga escala e verificou que milhares de genes "ligam" e "desligam" nos cérebros das abelhas em resposta a estímulos sociais.

Um desses genes, conhecido como "for" (para forrageamento, ou busca de alimento), foi descoberto inicialmente em moscas drosófilas por Marla Sokolowski, da Universidade de Toronto, no Canadá. Esses insetos carregam versões diferentes do gene for para diversos tipos de comportamento de forrageamento. Cada versão dá ao seu portador uma vantagem em certos comportamentos nas condições ambientais.

No estudo publicado em 2002, Robinson e sua equipe relataram que a expressão do for de fato aumentou no cérebro das abelhas enquanto elas se desenvolviam como forrageiras. A manipulação de sua expressão levava as abelhas a forragear precocemente.

Os pesquisadores descobriram também que os fatores sociais, sob a forma de sinais químicos conhecidos como feromônios, induziam a esse aumento do for. As abelhas forrageiras produzem um feromônio que sinaliza para as abelhas mais jovens que já existe uma quantidade de indivíduos suficiente exercendo essa função. Se algumas forrageiras são removidas da colméia, algumas abelhas jovens se desenvolvem precocemente como forrageiras.

"A constatação da idéia de que as diferenças na expressão genética podem ocorrer ao longo de escalas de tempo muito diferentes ajuda a compreender algumas das complexas relações entre genes, cérebro e comportamento. Todos esses elementos interagem", disse Clayton. "A experiência está sempre voltando para o nível do DNA", declarou.

O artigo Genes and Social Behavior, de Gene Robinson, Russell Fernald e David Clayton, pode ser lido por assinantes da "Science" em www.sciencemag.org.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Cientistas decodificam genoma de asiático, africano e paciente com leucemia

Redação central, 5 nov (EFE) - Três novas seqüências do genoma humano foram apresentadas esta semana na revista britânica "Nature", sendo duas delas de pessoas saudáveis - uma de origem africana e outra asiática - e a terceira de uma paciente com leucemia.

Os três trabalhos publicados hoje usaram a mesma técnica e têm a vantagem de dispor de uma seqüência padrão de referência, obtida nos projetos anteriores -o último, o seqüenciamento do genoma de James D. Watson, um dos descobridores da estrutura do DNA-, a qual é usada para comparar os dados destes indivíduos.

A técnica em questão recebe o nome de seqüenciamento em massa e em paralelo e permite distinguir até quatro milhões de variações individuais simples que afetam uma só base, conhecidas como SNPs (sigla em inglês para Polimorfismos de Base única), e centenas de milhares de variantes genéticas de maior tamanho.

Com o novo sistema desenvolvido pela empresa americana Illumina, o Genome Analyzer, é possível completar a leitura do genoma de um indivíduo em um prazo de oito semanas e por menos de US$ 500 mil.

O Projeto Genoma Humano apresentou, em junho deste mesmo ano, o programa 1000 Genomas, com um objetivo claro: conseguir um mapa mais detalhado da variação genética humana entre indivíduos e povoações.

Todos os genomas seqüenciados até o momento eram de indivíduos de procedência européia, portanto nesta ocasião a atenção se centrou em pessoas de outras origens: um homem nigeriano de etnia Yoruba e um indivíduo chinês de etnia Han.

A potência do Genome Analyzer, que abrange até oito gigabases por semana, e seu custo, mais acessível, fez com que sua aplicação no campo da pesquisa biomédica não tenha demorado a ser usado.

Uma equipe da Escola de Medicina da Universidade de Washington em Saint Louis (Estados Unidos) seqüenciou e comparou o genoma de células saudáveis e cancerosas de uma mulher com leucemia mielóide aguda (LMA), um tipo de câncer na medula óssea que interfere na formação das células sanguíneas.

Desta forma, foi possível descobrir dez variações no DNA das células cancerosas - em relação à seqüência saudável - relevantes no desenvolvimento da LMA, oito delas em genes que até agora não tinham sido relacionados com este tipo de câncer e únicas nesta mulher.

Samuel Levy e Robert L. Strausberg, pesquisadores no Instituto J. Craig Venter em Rockville (EUA), destacam que o desenvolvimento das tecnologias de seqüenciamento permitirão, em pouco tempo, entender melhor a complexidade da biologia e das doenças humanas.

Para eles, "isto é só o começo da era do genoma individual".

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Era do conhecimento

Divulgando a cultura científica
10/04/2008

Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, e Roberto Freire, presidente do PPS, falam sobre o papel da ciência para a melhoria nas condições de vida da população (foto: Márcia Minillo)
Especiais


10/04/2008

Por Thiago Romero

Agência FAPESP – Em todo o mundo, discussões sobre a importância do avanço do conhecimento científico tendem a ser marcadas com muita freqüência pelo discurso de caráter utilitário. É quando partem da sociedade perguntas como “para que serve determinada descoberta?”

O questionamento é válido, uma vez que, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, quando a ciência passou a ser um empreendimento fortemente estatal, os agentes envolvidos com as pesquisas científicas precisaram se preparar melhor para explicar aos contribuintes os benefícios sociais de seus estudos – principalmente aqueles desenvolvidos com financiamento público.

O assunto foi discutido na noite desta terça-feira (8/4), em São Paulo, durante debate paralelo à exposição Revolução Genômica, cuja programação cultural é organizada pela revista Pesquisa FAPESP.

Na ocasião, Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, e Roberto Freire, presidente do Partido Popular Socialista (PPS) e ex-senador da República, foram desafiados a responder o questionamento do título da mesa-redonda: “O avanço da ciência torna a humanidade melhor? Por quê?”.

Na opinião de Brito Cruz, como muitos setores da sociedade moderna são afetados diretamente pelos resultados das pesquisas científicas, é fundamental que os cidadãos comuns tenham um conhecimento geral, ainda que de maneira superficial, de alguns temas estratégicos que são investigados nas universidades e nos institutos de pesquisa.

“Nem todo mundo precisa entender a fundo como funciona o DNA, por exemplo, mas é importante ter noções sobre o assunto, se não a sociedade pode ficar sujeita a crendices que a induzem a se sentir enganada ou a desconfiar dos cientistas”, disse.

“Enquanto a ciência aprende novas coisas e ajuda o ser humano a se tornar dono do seu destino, cabe à sociedade se organizar para aplicar ou não esse conhecimento em benefício da população”, afirmou.

Por outro lado, segundo Brito Cruz, estar a todo momento em busca de benefícios práticos para a ciência pode ser um equívoco, considerando que há certas descobertas que não resultam em aplicação imediata. Muitos resultados de estudos serviriam mais para tornar a humanidade melhor do que para qualquer outro tipo de aplicação prática que pudesse resultar, por exemplo, na fabricação ou na inserção de um novo produto no mercado.

“Com sua curiosidade inata, o ser humano sempre procurou conhecer mais. Quando os cientistas pesquisam os corpos celestes, por exemplo, há uma preocupação em entender como funciona o Universo. Eles não estão necessariamente em busca de um benefício material a curto prazo”, disse.

Para Roberto Freire, se os seres humanos têm hoje a oportunidade de conseguir uma qualidade de vida cada vez mais satisfatória, em parte isso se deve ao conhecimento científico acumulado desde os primórdios da civilização em áreas como as que conseguiram decifrar detalhes sobre a evolução natural. “Os cientistas partem do desconhecido e se dedicam às suas pesquisas para inovar e salvar vidas”, assinalou.

“Por isso, há um grande respeito à ciência na sociedade e entre os políticos e, com exceção de temas polêmicos como o da liberação das células-tronco embrionárias, que envolve questões sociais e religiosas, tradicionalmente não há grandes impedimentos para discutir os usos e benefícios dos avanços científicos no meio político”, afirmou Freire.


Conhecimento pré-científico

Para o diretor científico da FAPESP, o exercício da ciência, na maioria dos casos, tende à criação de melhores condições de vida para a população. “Se formos acompanhar o progresso da humanidade, ao analisarmos as crenças seguidas pelo homem por meio de religiões e de histórias mitológicas, o assunto do conhecimento sempre esteve presente de forma relevante”, apontou.

Ele ilustrou a afirmação com uma passagem bíblica, presente no livro do Gênesis: tentada a pegar o fruto da árvore do conhecimento, Eva foi expulsa do Paraíso. “Mesmo preocupado com os perigos e as conseqüências do conhecimento, o ser humano sempre foi atraído pelo conhecimento por conta dos benefícios que ele pode trazer”, afirmou.

Para Brito Cruz, também foi determinante para o avanço do conhecimento humano o desenvolvimento de um sistema de aplicação do método científico para atacar os problemas à medida em que eles aparecem.

“No século 18 houve uma notável mudança nas pesquisas devido ao uso do método da ciência, o que permitiu aos pesquisadores aprender com os erros e testar novas alternativas até conseguir resultados mais confiáveis”, disse.

Seguindo essa linha de raciocínio ele destacou que a ciência, quando passou a ser feita de maneira mais organizada, em especial a partir do século 16, permitiu, entre outros avanços, um aumento na expectativa de vida da população.

“O que o ser humano mais deseja em sua existência é viver mais. Se na época em que não existiam medicamentos como antiinflamatórios ou penicilina as pessoas viviam, em média, 40 anos, agora estamos caminhando para uma expectativa de vida perto dos 90 anos. E cientistas da área de saúde já estão dizendo que, se conseguirmos vencer o desafio da hipertensão, poderemos viver até 120 anos. Nesse caso, o desafio científico passará a ser o do sistema previdenciário”, apontou Brito Cruz.

Para ver as próximas palestras e debates da programação cultural da Revolução Genômica, clique aqui.